Mia Couto Lamenta Ausência de Respostas Claras Sobre
advertisement O escritor Mia Couto manifestou esta quarta-feira, 20 de Agosto, a sua preocupação face à falta de clareza na opinião pública nacional relativamente à identidade e origem dos insurgentes que têm vindo a atacar a província de Cabo Delgado, no Norte do País, desde 2017. “A minha preocupação é que a opinião pública moçambicana, até hoje, não teve uma resposta clara sobre quem são, de onde vêm e, portanto, qual a origem dos rebeldes que têm atacado a província desde 2017. É evidente que todos os moçambicanos estão solidários, estão unidos para combater esta agressão e estão solidários com o empenho dos nossos soldados nesta luta”, declarou Mia Couto, em entrevista à agência Lusa. O escritor defendeu a necessidade de maior informação pública sobre o que se passa no terreno, para mobilizar a sociedade moçambicana na resposta à violência. “O que me preocupa como cidadão é que não percebemos o que está a acontecer. Quem está lá? Quem são? O que querem? Qual é a relação deles com a população? Qual é a principal via de entrada: é a narrativa religiosa? É a criação de um Estado islâmico? É a manutenção de corredores de tráfico de droga e de acção do crime organizado, como já foi referido?”, questionou. Reconhecendo que certos aspectos exigem sigilo absoluto por questões de segurança nacional, Mia Couto lembrou que a solução profunda e duradoura não pode ser apenas militar. Assim, defende um maior envolvimento da sociedade civil no entendimento do conflito. As declarações foram feitas durante o lançamento do projecto “Colecção Gosto de Ler”, esta semana, em Maputo, uma iniciativa do Standard Bank, em parceria com a Fundação Fernando Leite Couto. O projecto visa distribuir 25 mil exemplares de livros de cinco autores nacionais em bibliotecas do País: João Paulo Borges Coelho, Paulina Chiziane, Lília Momplé, Albino Magaia e o próprio Mia Couto. Violência em Cabo Delgado: uma crise em evolução Desde Outubro de 2017, a província de Cabo Delgado, rica em gás natural, tem sido alvo de uma rebelião armada. Os ataques são atribuídos a movimentos associados ao grupo extremista Estado Islâmico, com uma nova vaga de violência iniciada no final de Julho, sobretudo no distrito de Chiúre, que já provocou mais de 57 mil deslocados, segundo organizações humanitárias. Cabo Delgado sofre ataques terroristas desde 2017 Face ao contexto, Mia Couto considera que o Governo deve continuar a combinar respostas militares e sociais, com políticas de inclusão, criação de emprego e esperança para os jovens. “Não creio que se possa separar a resposta militar da intervenção humanitária. Seria um erro. Cada soldado nosso deve ser também um agente humanitário, promotor do respeito e da solidariedade humana. Os soldados que estão no terreno devem mostrar que são irmãos e irmãs dos camponeses, e que estão ali para dar a vida não apenas pela soberania nacional, mas, acima de tudo, pela protecção das vidas e dos bens das pessoas que já têm tão pouco”, defendeu. “Estou certo de que os nossos soldados sabem que nunca podem inspirar medo na população. Os únicos que devem ter medo são os terroristas”, reforçou o escritor. Causas estruturais e ausência do Estado Mia Couto rejeita a ideia de que os ataques se tratem apenas de uma guerra religiosa ou resultem exclusivamente da pobreza, como acontece noutros países. Para o escritor, a origem do conflito está também ligada à ausência do Estado na região. “Trabalhei durante anos em Mocímboa da Praia e ficou-me claro que havia uma completa ausência do Estado. Estamos a falar de há 15 anos. O Estado não existia. A maioria das pessoas acompanhava o mundo através da rádio da Tanzânia. Os camponeses tinha mais ligação com a Tanzânia do que com Maputo, que para eles é outro país, outro mundo”, explicou. Segundo um estudo divulgado em Fevereiro pelo Centro Africano de Estudos Estratégicos (ACSS), pelo menos 349 pessoas morreram em ataques de grupos extremistas islâmicos no Norte do País em 2024, um aumento de 36% em relação a 2023.advertisement
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